O Congresso Nacional aprovou, em 5 de maio, em uma sessão de quórum baixo, a realização do plebiscito para subdividir o Pará e criar dois novos estados: Carajás e Tapajós. O Pará é o segundo maior estado do país, ficando atrás apenas do Amazonas. Abrange uma área de 1.247.703 km², o que o tornaria impossível de se administrar,  na opinião dos deputados Lira Maia (DEM-PA) e Giovanni Queiroz (PDT-PA), autores do projeto. Os interesses políticos e econômicos por trás do projeto, no entanto, ainda não foram esclarecidos. Além disso, o Pará, e mais especificamente a região que abrangeria os possíveis dois novos estados, está no topo da lista das unidades da federação que mais desmatam a Amazônia, têm violentos conflitos por terra e a presença de trabalho escravo, além  de abrigar a maior bacia hidrográfica e a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo.

O projeto propõe que o estado de Carajás fique com 25% do território atual do Pará e 23% da população. Já Tapajós, ficaria com 58% do território e apenas 16% da população. Carajás se tornaria o estado mais violento do país, no entanto, herdaria as maiores reservas minerais e empreendimentos da região. É lá que está localizada a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo, operada pela Vale. Em 2010, a mineração correspondeu a 86% das exportações paraenses. Atualmente, apenas os municípios de Marabá, Parauapebas e Canaã dos Carajás, todos em território do que seria Carajás, recebem mais de 80% dos royalties da exploração mineral. Além disso, a Vale prevê investimentos na região, até 2015, da ordem de US$ 33 bilhões.

Tapajós por sua vez, ficaria com as minas de bauxita do Rio Norte (Oriximiná), de Juruti e a usina hidrelétrica de Belo Monte. Segundo a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, Altamira, região onde será instalada a usina, receberá cerca de R$ 3,2 bilhões em compensações e investimentos no desenvolvimento socioeconômico pela construção de Belo Monte.

Mas Carajás também herdaria os problemas sociais e ambientais que hoje são de responsabilidade do Pará, concentrando a maior quantidade de casos de violência no campo e trabalho escravo registrados na Região Norte. Foi lá que ocorreu o episódio que deu origem ao Ministério da Reforma Agrária, o Massacre de Eldorado do Carajás. Em 17 de abril de 1996, 19 sem terra foram mortos em confronto com a polícia a mando do governo do estado. Segundo legistas, a polícia  tentou simular que as mortes teriam ocorrido por conflitos internos do MST, utilizando seus instrumentos de trabalho (foices e facões) contra as vítimas. Desde então, segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 212 pessoas morreram em disputas por terra, a maioria na região de Carajás. Nos casos de trabalho escravo, a região também lidera: dos 70 casos que a CPT identificou no Pará em 2010, 58 aconteceram em municípios que formariam o novo estado.

O deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), em entrevista exclusiva ao Opinião e Notícia, diz que há evidentes interesses econômicos na tripartição do Pará. Ele lembra que a riqueza mineral de Carajás reverte pouco para o estado e Tapajós, com sua biodiversidade e potencial hidrelétrico, é hoje um ativo econômico fundamental para o Pará. “Os defensores da divisão do Pará sempre trazem o exemplo de Tocantins, que, segundo eles, se desenvolveu muito. Só que com base no agronegócio, na pata do boi e no desmatamento, o que não pode ser o caminho das regiões do Pará que se quer desmembrar.  Progresso é também preservação de florestas, exploração sustentável, manejo adequado, investimento local de verdade, Poder Público ativo, presente, regulador, que contenha a sanha dos interesses privados e das oligarquias predatórias. Como se vê tragicamente agora, licença para desmatar e licença para matar andam juntas, e isso é particularmente grave no Norte do país”, explica.

O deputado questiona ainda a pressa com que os autores do projeto querem realizar o plebiscito — até o fim do ano. “A votação na Câmara foi apressada e simbólica, e apenas nós ( o PSOL) nos manifestamos. Destacamos a necessidade de um debate mais detalhado e de se evitar a ilusão de que basta uma redivisão político-administrativa para que os problemas da população mais pobre, a que mais necessita do Poder Público, sejam resolvidos”, diz.

O PSTU divulgou uma nota contra a divisão do Pará. O partido considera os argumentos dados pelo governador Simão Jatene e os demais defensores do projeto um absurdo. “Não é o tamanho do estado o que determina o seu grau de desenvolvimento humano, social e a competência administrativa de seus gestores”. O documento diz ainda que o controle do estado está nas mãos de multinacionais, como a Vale e de “um punhado de latifundiários e mega-empresários que controlam não só as riquezas do nosso estado, mas o próprio estado através dos principais partidos como o PSDB, o PMDB e o PT”.

Autor do projeto, Giovanni Queiroz, está convicto de que o povo aprovará a criação dos estados em plebiscito. Ele diz ainda que seu projeto representa o interesse de 1.600 habitantes do Sul e do Sudeste do Pará que desejam isso há mais de 30 anos. “Como deputado federal, abracei esta causa, que é uma causa de todos, com o objetivo de transformar aquela região num lugar mais adequado para se viver bem”, diz o deputado. O PSTU rebate e diz que “o descaso e a incompetência do governo não afetam apenas a população do Sul e Sudeste do estado”.

A divisão do estado do Pará, no entanto, não esclarece quais as melhorias imediatas para a população. Além disso, não são explícitos os gastos que a população deverá pagar pela criação de dois novos aparatos burocráticos — cada deputado custa ao país mais de R$ 100 mil, por ano. Fato é que seriam abertos novos cargos executivos e empregos públicos. O deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) diz que “é uma falácia achar que criar estado e município reforça a Federação, melhora a vida do povo. Não necessariamente. Se fosse assim, a Lei de Terras, de 1850, teria, por exemplo, melhorado a distribuição fundiária no país; mas, pelo contrário, a concentrou”.