Em 2010, os brasileiros gastaram R$ 805,7 bilhões com tributos. O cenário já aponta para o aumento na arrecadação. Por Layse Ventura

Muito se fala sobre a reforma tributária no Brasil, mas poucos sabem os benefícios que esta mudança pode trazer para o rendimento de uma família. Outro problema que aflige os brasileiros é a falta de informação sobre quanto se paga ao governo em impostos, taxas e cobranças.

E todos os brasileiros pagam impostos. Mesmo aqueles que atuam na economia informal ou são isentos no imposto de renda. No Brasil, o sistema tributário é composto por 61 tributos diferentes, que, mesmo que não sejam pagos diretamente pelos brasileiros, são custos repassados pelas empresas aos seus clientes.

“Ao todo, são 61. Os impostos embutidos nos preços de produtos e serviços são os que mais pesam no bolso do consumidor”, explica o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike.

Para se ter uma ideia desse montante, em 2010 os brasileiros gastaram R$ 805,7 bilhões com o pagamento de impostos e contribuições federais. Um aumento de 9,85% em relação ao ano de 2009. O cenário para 2011 aponta para um período de crescimento no recolhimento de tributos. Somente nos três primeiros meses do ano, o Fisco já recolheu R$ 226.194 milhões.

O que é “reforma tributária”?


A reforma tributária consiste em mudar a estrutura e leis que regem os impostos, taxas e contribuições vigentes no país. Neste ano de 2011, o Congresso Nacional analisa uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que visa aperfeiçoar o sistema de cobrança e recolhimento desses tributos, diminuindo também a sonegação fiscal.

A presidente Dilma Rousseff se reuniu com líderes da base aliada no final de março para pedir por uma reforma fracionada. A ideia defendida pelo governo é que é mais fácil aprovar os projetos a conta-gotas do que em bloco no Congresso Nacional.

Os problemas do Código Tributário Nacional


A reforma só é uma proposta viável porque o sistema atual de tributação está incongruente. A tributação direta pelo imposto de renda, por exemplo, é proporcionalmente muito menor do que em outros países.

O problema é que a tributação indireta é muito maior. Além de ser cobrada em todos os produtos de consumo (do arroz ao videogame), ela é menos transparente (você não sabe quanto paga em cada produto) e atinge todas as camadas da população de forma igual. O preço de um quilo de feijão é o mesmo para o Zé das Couves e para o Eike Batista.

Para as empresas, um dos maiores problemas é a falta de competitividade que os impostos instauram. Com altas cargas tributárias, os empresários repassam esse custo ao consumidor. O problema é que o preço final fica mais caro do que produtos semelhantes importados, reduzindo a competitividade de empresas nacionais.

Como funciona a reforma


O principal objetivo da reforma fiscal é simplificar e reduzir a tributação nacional. Além disso, o governo pretende acabar com a guerra fiscal entre os estados, corrigir distorções nas estruturas tributárias, atrair investimentos privados e promover o crescimento econômico sustentável.

A primeira proposta de simplificar a tributação vai atingir principalmente pequenas empresas. A ideia é reajustar o limite de faturamento para enquadrar mais empresas no programa Simples Nacional — que atualmente só funciona para as micro e pequenas empresas.

Enquanto a tributação da maior parte dos países é feita sobre o patrimônio e a renda, no Brasil ela é feita sobre a produção e o consumo. O país tem seis impostos indiretos, com grande diversidade de legislações — IPI, ICMS, Cofins, PIS, Cide, e ISS. O ICMS, de competência estadual, apresenta 27 diferentes legislações, com enorme variedade de alíquotas e critérios de apuração.

ICMS


O governo pretende acabar com a “guerra dos portos”. Como a legislação atual sobre a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) não funciona, o governo estuda oferecer aos governadores compensações financeiras — como, por exemplo, em obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

A “guerra dos portos” começou com os estados menos desenvolvidos, que para atraírem empresas ofereciam benefícios, como a redução de ICMS. Com o passar do tempo, os estados mais ricos começaram a praticar também a guerra fiscal.

O problema dessa disputa é que além de gerar uma anarquia tributária — cada estado dá para cada empresa uma redução ou isenção de determinado valor –, gera uma insegurança para os investidores — que não têm nenhuma garantia de que determinado competidor receberá benefícios maiores e se tornará mais competitivo na região.

Uma parte da cobrança do ICMS é feita no estado de origem da mercadoria (normalmente corresponde a uma alíquota de 12%) e outra parte é feita no estado de origem. Essa estrutura gera problemas com as exportadoras, que não conseguem ser ressarcidas, pois os estados argumentam que teriam que ressarcir um imposto que foi pago para outra unidade da Federação.

A proposta do governo é de reduzir gradativamente a alíquota geral do ICMS nas operações interestaduais até o valor de 2% em 2014 — mas que pode ser fixada em 4% conforme desejam os estados. A decisão valeria tanto para produtos nacionais quanto internacionais.

Retorno em infraestrutura


No sistema tributário brasileiro, cerca de 65% do que o governo arrecada advém dos tributos sobre a produção e consumo. O problema é que esse total não retorna para a sociedade como deveria. Os brasileiros pagam por um serviço que é mal feito, como no caso dos aeroportos, ou que tem de ser pago duas vezes, como ao contratar um plano de saúde particular quando já existe o serviço público de saúde.

Uma das raízes deste problema está no tratamento igual dispensado pelo governo às empresas que trabalham com infraestrutura.

Como é interesse nacional a produção de estradas e portos, por exemplo, as empresas do setor acreditam que devem receber um tratamento diferenciado do fisco. A ideia é que a cobrança de impostos seja reduzida, já que o trabalho deles é um investimento em infraestrutura. E, uma vez concluído o projeto, o governo teria mais uma fonte de arrecadação.

Desoneração tributária


Outro ponto sensível do sistema tributário é a elevada carga cobrada na folha de salários das empresas. A cobrança advém da contribuição previdenciária, do FGTS, e do financiamento de programas que não tem qualquer relação com o salário dos trabalhadores, como o salário educação — contribuição do trabalhador para a educação básica — e o Sistema “S” — o conjunto de contribuições destinadas a entidades como o Senac, Sesi, Sesc, Senat, entre outras.

Para contornar o problema, o governo estuda realizar a desoneração tributária de empresas. Ou seja, desobrigar as empresas a fazer o pagamento de certos tributos. Com esta política, o governo reduz o custo tributário para as empresas formais e para os consumidores, amplia a competitividade do país e incentiva a formalização do mercado de trabalho.

Para simplificar a cobrança, a ideia é extinguir, no segundo ano após a aprovação da reforma, cinco tributos e criar um único imposto, o Imposto sobre o Valor Adicionado (IVA-F). O governo, assim, manteria neutra a arrecadação. Seriam extintas a Cofins (destinada a aposentadoria), o PIS (destinado ao pagamento de seguro-desemprego), a Cide-Combustíveis (cobrada sobre a importação e a comercialização de petróleo), o Salário-educação, e, futuramente, a CSLL (destinado a Seguridade Social) — incorporada ao imposto de renda de pessoas jurídicas.

Já o INSS sofrerá uma redução em sua cobrança na folha de pagamento de 20% para 14%. Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, a redução será feita de forma horizontal pelo governo. Juntamente com a extinção do salário Educação, o governo pretende reduzir em 8,5% a tributação em folha de pagamento.

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